A grande maioria das pessoas não gosta de falar ou ouvir falar sobre o suicídio. O apego à vida é natural em quase toda a gente. As pessoas desejam viver e ter saúde. Desejar a morte e agir pondo em causa a própria vida é estranho e pouco ou nada compreensível para a esmagadora maioria das pessoas. E, no entanto, é importante conhecer o problema do suicídio, de modo a ajudar a prevenir essa trágica situação. Este pequeno texto visa informar de forma sucinta e prática sobre a questão, numa perspectiva médico-psicológica.
«Não tenho vontade de viver»
Quando alguém pensa ou diz: «Não tenho razão para viver (...); não tenho vontade de viver, preferia morrer… seria um alívio morrer». Quando alguém, de modo ainda mais claro afirma: «Tenho a ideia de pôr termo à vida». Ou ainda, quando alguém, levado por um estado de desespero, agiu para preparar o acto de suicídio (e o suspendeu, hesitou...), ou tentou e não o consumou, porque sobreviveu. Em situações como as descritas ou idênticas, estamos perante um risco para a vida que nos cumpre consciencializar de forma que, quem precisa, tenha a ajuda necessária para vencer o desespero. Desde logo é preciso tomar consciência de que na maioria dos casos as ideias de suicídio e as tentativas de suicídio são uma manifestação de várias doenças psíquicas, e muito em especial da depressão. Quem tenha passado por uma crise depressiva sabe muito bem o sofrimento, as tormentas que atravessou, mesmo que outros não possam entender a doença do desespero, do desinteresse, da fraqueza, da angústia, da culpa, do desapego à existência, do desespero máximo, que pode culminar no suicídio. Alguém que sofre ou tenha sofrido uma depressão grave sabe bem que os sentimentos de desespero e as ideias de suicídio são os sintomas mais assustadores. Resiste-se a uma grave doença física, é precisa mais coragem ainda para enfrentar e vencer o sofrimento psíquico de uma grave depressão!
O suicídio pode ser evitado
Nada de mais errado do que uma atitude fatalista, infelizmente tão vulgar na opinião pública: “aconteceu porque tinha de acontecer...!” Muitos pensam que o suicídio é uma livre escolha da pessoa, uma manifestação da sua autonomia. Erradíssimo! O suicídio é, em geral, a expressão final de um estado psíquico de limitação da liberdade, produzido a maioria das vezes por uma doença que é possível tratar. É necessário reconhecer as ideias de suicídio pelo que são de facto: a expressão de uma doença que tem remédio. Pensar no suicídio, a ideia de atentar contra a própria vida, é um sintoma de perturbações depressivas, e também o que a pessoa é levada a pensar quando já não consegue enfrentar os outros sintomas da depressão. É tal o desespero sentido nestas perturbações, que o suicídio parecer ser a solução, a saída, para o sofrimento insuportável. A alguém que esteja nessa situação desesperada, impõe-se uma ajuda urgente:
- Conte ao seu médico. As ideias de suicídio são um sinal que é indispensável a ajuda médica para o tratamento que irá aliviar o seu sofrimento.
- Conte a uma pessoa amiga e em quem confia. Uma pessoa que o possa compreender, com quem possa abrir-se, que possa aconselhar. Uma pessoa que não exerça uma crítica preconceituosa, que o rejeite e desvalorize, mas que seja solidária consigo, que veja no seu desespero uma manifestação da perturbação emocional, da doença, e de uma grande necessidade de ajuda, e de tratamento.
O tratamento da depressão pode não ser imediatamente eficaz. A pessoa pode chegar a descrer de tudo, até da possibilidade de melhorar. Mas é quase certo que se persistir, se aceitar e seguir as medicações e os tratamentos propostos, irá recuperar. A regra essencial é não desistir, lembrar-se que já em outras ocasiões, em crise anterior (se for o caso), conseguiu superar a doença. Por vezes leva algum tempo até acertar a terapêutica e a medicação que vai ajudar. A depressão pode levá-lo a descrer na própria eficácia e utilidade do tratamento, mas com algum tempo o túnel do desespero irá acabar.
Reconhecer o risco e evitá-lo
Há muitos estudos sobre factores de risco de suicídio. O factor mais importante é, sem dúvida, a doença psíquica. Quando não tratadas, as depressões mais graves são doenças que se acompanham de risco de suicídio, tanto em doentes bipolares, como em unipolares. Doenças como a esquizofrenia, perturbações ansiosas graves, a dependência do álcool e de drogas em geral, são também perturbações psiquiátricas que podem predispor ao suicídio, no caso de não serem tratadas e conduzirem a situações de desespero prolongado. Quando se junta à doença (e, em parte por causa da doença), o isolamento da pessoa, o seu desenraizamento, a falta de apoios, a falta de tratamento, e complicações aparentemente insolúveis no viver, nesse caso, os riscos para um acto desesperado podem aumentar mais. Mas haverá sempre uma solução. A vida é feita de altos e baixos. Há ajuda, terá é que ser encontrada. Se for indispensável, a pessoa será hospitalizada, para uma terapêutica mais intensiva e controlada. Um episódio de ideias de suicídio é sempre temporário. Os que sobrevivem a essa fase mais negra e arriscada olharão para trás, depois de recuperarem a saúde, sem perceber como lhes aconteceu esse pesadelo, essa doença que lhes retirou toda a esperança. O risco de suicídio é maior nas primeiras crises de depressão, pois a pessoa aprende com a experiência e verificar que as crises passam, aprende a reconhecer a doença como uma doença que se trata, melhora e pode prevenir assim o suicídio. Os familiares e os amigos da pessoa que sofreu uma grave crise com ideias de suicídio devem reconhecer o mal pelo que é, uma doença, uma perturbação emocional, de que quem sofre não é culpado. O que a pessoa precisa é de ajuda, compreensão, comunicação, e, sempre e quando for necessário, do tratamento médico e psicológico.
Vencer a depressão
As ideias de suicídio, tal como outros sintomas da depressão, podem ser tratadas. Para que possa ser ajudado/a, o seu médico ou outros profissionais da saúde deverão saber o que se passa consigo, quais os seus pensamentos e sentimentos. Só se forem convenientemente informados, por si que sofre ou por alguém que melhor sabe o que se passa consigo, poderão tomar as medidas terapêuticas necessárias, ajustar a medicação ou modificar o tratamento. O controlo adequado de uma crise depressiva, a prevenção e a atenuação dos sintomas, fazem com que volte a acreditar na vida e a viver.
Adaptação de Documento da ADEB Associação de Apoio aos Doentes Depressivos e Bipolares